Vila de D. Jaime século XVI
A. 1. 5.c
As intervenções de meados do séc. XX na estrutura urbana e nos monumentos de Vila Viçosa põem um problema de autenticidade e integridade a qualquer pretensão desta vila se apresentar como um modelo de vila ducal renascentista (ou sequer tardorenascentista/maneirista). E uma boa parte da dificuldade está no esquecimento do Cerco e na anulação de qualquer memória da heróica resistência que a guarnição da Fortaleza opôs, contribuindo decisivamente para que ocorresse a batalha campal nos vizinhos Montes Claros, e o exército português lograsse vencê-la (como se pode ver em (#VilaViçosaNãoSeRende e http://kalikhora.wixsite.com/…/castelo-na-prova-de-fogo-real)
Nem se valoriza o significado histórico-simbólico daí resultante e que acresce ao relevante lugar da Fortaleza Nova na história da arquitectura militar mundial. Nem se compreende a importância (arquitectónica e simbólica) da relação entre a fortificação de quinhentos (inserida na procura de modelos pelos italianos) e as fortificações de seiscentos (aqui e em toda a raia da Guerra da Restauração ou de La Guerra de Portugal), às quais é reconhecido o contributo para o (e não do...) famoso modelo Vauban, concretizado numa série de fortificações, oito delas classificadas como património mundial.

A. 1. 5.d
A compreensão de como no desenvolvimento da urbe se articularam lógicas militares e civis é prejudicada, precisamente, pela leitura que dela fez o Regime de Salazar e que Duarte Pacheco impôs ao desenho de toda a Vila. Ao ignorar o impacto desta leitura, este processo de candidatura fica-se incapaz de aproveitar os contributos dos historiadores da arte militar. E não o fazendo, fica-se incapaz de compreender e ajudar a compreender a habitantes e visitantes o valor mundial de uma das suas singularidades.
Desvalorizando esta parte do património e da história, perde-se a possibilidade de pôr em evidência uma singularidade e talvez a excpcionalidade de uma sequência na arquitectura e urbanismo renascentista e barroco, que começa quando D. Jaime decide construir um palácio residencial e de recepção relativamente distante (para a época) da alcáçova medieval, mas colocando o conjunto da nova urbe ao abrigo de uma nova fortificação [a Cerca Nova ]. Esta foi uma iniciativa precoce, à revelia da tendência para dar um desenvolvimento palaciano a fortificações da Guerra dos Cem Anos ou para a construção de palácios acastelados ou mesmo verdadeiramente fortificados, como exigia o contexto das rivalidades italianas. Este é um aspecto que se articula com a valorização do desenho urbanístico que é feita na retórica desta candidatura, mas onde o lugar da fortaleza é desvalorizado. E no entanto, foi esta separação entre residência e fortificação que permitiu, por um lado os desenvolvimentos da arquitectura militar em torno à fortaleza, e por outro, que a partir de um palácio inteiramente civil no estilo e na função, se constituísse um lugar com espaço para a progressiva construção de edifícios dedicados ao culto religioso, às artes e à residência de toda uma côrte, levando ao desenho do magnífico Terreiro do Paço e ao desenvolvimento de uma pequena urbe tardorenascentista marcada pela poderosa presença e influência cultural desta côrte.
Que isto tenha ocorrido numa pequena povoação, relativamente afastada das principais vias militares e comerciais, e que, tendo ocorrido, a povoação não se tenha desenvolvido como uma cidade, nem sequer como uma pequena cidade, é isso que faz os visitantes surpreenderem-se e os estudiosos questionarem-se e investigarem.
#viladucal #vilaviçosa #vilaviçosaNãoseRende #culturadoPatrimónio
Enquanto isso, graças à opção urbanístico-militar de D. Jaime, foi criado outro lugar, a partir de um palácio inteiramente civil no estilo e na função, onde havia espaço para a progressiva construção de edifícios dedicados ao culto, às artes e à residência de toda uma côrte, com que se acabou por desenhar uma magnífica praça palaciana, que alguns tomam como parte do próprio paço e outros como o Paço mesmo; matriz de sucessivos ensanches, que viriam a gerar a necessidade de outro tipo de fortificação militar, a Cerca Nova, desmontada dois séculos depois, mas que esteve na origem de vários lugares: praças, campos, denominados em Itália por piazze ell'erba e no Alentejo por rossios e defesas; defesa, espaço aberto ao tiro defensivo a partir da nova cerca e da fortaleza; defesa urbanística também, pela proibição de neles levantar edificações, e por isso mantidos disponíveis para muitos outros usos, estacionamento de gado em deslocação ou durante feiras (e hoje de viaturas automóveis), exercícios/paradas militares, parque de feiras e festas, parques desportivos e parques de lazer arborizados que ainda hoje são essenciais à vivência e leitura visual da urbe – não obstante alguns se obstinem em não perceber. #viladucal #vilaviçosa #vilaviçosaNãoseRende #culturadoPatrimónio

Se a restauração da memória e da importância de D Jaime passa pela presença bem visível de uma evocação plástica/artística num dos lugares adjacentes ao que resta da Cerca Nova (Não na via de entrada na Vila pelo Terreiro do Paço que foi ridiculamente concebida e desenhada como rua e a que puseram o nome de Rua D. Jaime. Já o lugar para a reabilitação da memória do cerco, por oposição ao Terreiro do Paço, onde se instalou Caracena, é o espaço frente à fortaleza quinhentista, mas que Duarte Pacheco impôs que fosse frente à “Porta de Évora medieval”.
. É aí, nesse lugar ainda mal definido, entre a Avenida do séc. XX, o que resta da Estacada ou da sua memória, a (re)construída Porta de Évora e a Fortaleza a reabilitar que, de algum modo, as gerações mais recentes podem, têm que (?) inscrever física e simbolicamente a sua leitura da urbe, da Vila e da sua história, resgatando-a, ou não, da main-mise salazarista. A retórica desta candidatura e o seu processo não estão a ajudar. Pelo contrário, esse lugar é, nesta candidatura, o lugar de todos os equívocos. Como o é visivelmente na página que a CMVV tem na net dedicado ao Castelo de Vila Viçosa:
